Dezesseis horas e céu encoberto. O sol pálido longe aparece, mas não por muito tempo. Logo uma nuvem o esconde e faz com que uma plena tarde de sexta-feira mais pareça um começo de noite. Não há tempo de chuva, pelo contrário. Ela parece ainda distante. O ar seco rasga a garganta e faz lembrar da triste realidade do Pantanal.
Assim começa mais uma visita da equipe do Campo Grande News ao Pantanal. A missão é retratar os efeitos das queimadas na porção norte do bioma em Mato Grosso do Sul. Por ora, o trecho percorrido foi de Campo Grande à Coxim, pela rodovia BR-163.
Mesmo assim, apenas no começo, muita coisa já foi constatada: o cenário é preocupante. Muito preocupante. “Quase não dá para enxergar a estrada chegando aqui em Coxim”, conta Silas Lima, responsável por conduzir a ‘viatura’ de reportagem.
A fumaça que toma conta do horizonte não deixa enganar que o Pantanal está queimando. Não deixa enganar que o cerrado está queimando. No caminho, os sinais da devastação são facilmente encontrados logo que a equipe saiu de Capital.
O verde da grama foi quase que totalmente substituído pelo amarelo. Ou pior, pelo cinza e preto daquilo que, há pouco tempo, estava em brasas. Em uma fazenda, cerca de 150 km de Campo Grande, ao menos 50 hectares foram consumidos.
Seja em Jaraguari, São Gabriel do Oeste ou Rio Verde de Mato Grosso, qualquer uma dessas cidades nas quais a reportagem passou, a poeira foi outro fator que prejudicava a qualidade do ar. Já o sol, esse continuou lá, ora escondido, ora tímido e alaranjado.
Passarela de areia
Logo a equipe chegou à Coxim e deu de cara com outra situação triste: o rio Taquari está com o nível baixo. Muito baixo, a ponto de um homem conseguir transitar nos bancos de areia ali existentes – muitos causados também pelo assoreamento recorrente por esse importante rio sul-mato-grossense.
Fumaça, poeira, areia no rio e calor. Miseravelmente quente está Coxim nesse período. O calor na cidade não é novidade para ninguém, mas a situação de agora incomoda até mesmo quem já está acostumado com o local. Na terça-feira (15), a sensação térmica era de 46°C e os termômetros marcavam 38,5°C, com umidade em 16%.
“Não tem como dispensar o tereré com um tempo desse. Está calor e seco demais. Tem que tentar amenizar isso de qualquer jeito. E nesse momento não tem como não temer doenças respiratórias, principalmente nas pessoas mais velhas”, comenta o instalador de som automotivo Eleandro Lima, uma das pessoas com quem conversamos.
Ele não era o único na rua. Muita gente não aguenta ficar em casa e vai sai para tentar escapar do ‘bafo quente’ e dos arranhados na garganta típicos do tempo seco. “As pessoas estão ficando acordadas por mais tempo, pois dentro de casa está um inferno”, completa Eleandro, que tem 32 anos. “Está complicado”, conclui.
Balde d’água e o que mais der – Kalisson Correa tem 27 anos e um filho de apenas sete meses de idade. Mecânico, além de encarar o dia a dia na oficina, trabalhando ao lado de motores em plena combustão, ele precisa chegar em casa e ‘espantar’ o calor e secura
“Olha, tomamos medidas alternativas para tentar melhorar a situação. Usamos toalhas umedecidas, balde de água perto da cama, aparelho umidificador, tudo o que der. Quanto ao calor, tenho ar condicionado em casa, mas temo que o ar quente que o próprio umidificador solta misturado ao ar frio cause um choque térmico no meu filho”, diz Kalisson.
Ele ainda relata que a condição do ar já vem causando problemas para o bebê. “Ele está com bastante tosse e com o nariz escorrendo. Acho que até estou dando remédios demais para ele diante de tantos sintomas que não passam, mas é por causa de alergias que esse tempo causam nele, infelizmente”, comenta.
Neste sábado (19), a equipe do Campo Grande News segue viagem Pantanal adentro, agora em estrada de terra, a velha e boa – para quem não está o encarando, claro – pista de chão batido.
Em meio à Transpantaneira, a reportagem vai buscar imagens e relatos da situação vivenciada em parte do Pantanal além do que usualmente é retratado, nas proximidade de Corumbá. A porção norte é uma das mais afetadas pelo fogo, prejudicando a riqueza da flora e da fauna pantaneira – que se estende por estados e países.
Fonte: CGN-Por Nyelder Rodrigues e Marcos Maluf