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Direitos humanos são coisa de… rios e árvores? Conheça nova lei no Mato Grosso

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Com aproximadamente 90 mil habitantes e cortada pelo rio Paraguai, a cidade de Cáceres, no estado de Mato Grosso, é a primeira cidade do Pantanal a estabelecer um “status humano” para a natureza.

Após uma mobilização da sociedade civil, a Câmara de Vereadores aprovou recentemente uma alteração na Lei Orgânica que reconhece o meio ambiente como portador de direitos no município.

Embora a medida já tenha sido adotada em outros países, como Equador e Bolívia, no Brasil apenas outras cinco localidades têm entendimentos como o de Cáceres: Bonito e Paudalho, ambas em Pernambuco; Florianópolis, em Santa Catarina; Serro, em Minas Gerais; e Guajará-Mirim, em Rondônia. A mobilização popular para reconhecer a natureza como sujeito de direitos em Cáceres teve como pano de fundo diferentes ameaças ambientais.

Produtos químicos nas nascentes
O educador popular e ambiental Isidoro Salomão, membro da Sociedade Fé e Vida, cita o uso de produtos químicos nas propriedades rurais, que impactam nascentes, e o licenciamento de projetos para transportar cargas através do Rio Paraguai como problemas que colocam em risco o bioma.

Segundo ele, em meio a esse contexto, a alteração na Lei Orgânica do município foi entendida pelas entidades locais como uma ferramenta para proteger o Pantanal.

Fizemos um trabalho de quatro anos, vendo quais eram as principais ameaças ao Pantanal e ao Rio Paraguai, e resumimos isso no pacote do agronegócio. Tanto a hidrovia, como a mineração e o agrotóxico fazem parte disso.
Isidoro Salomão, educador ambiental

Uma série de ações precisaram ser traçadas até a aprovação da medida. Primeiro, comitês, coletivos e associações buscaram informações sobre a inclusão de direitos para a natureza na lei junto a fóruns ambientais.

Depois, organizaram oportunidades de aprendizagem e uma conferência sobre o tema para decidir como seguir com a ideia. O assunto também foi discutido em audiência pública antes de ser aprovado por unanimidade entre os vereadores de Cáceres.

Na Câmara, o projeto teve a autoria do vereador Cézare Pastorello (PT). “Foi uma verdadeira mobilização de base, um projeto que nasceu dentro do nosso território, não de um gabinete”, ressalta Salomão. O educador popular observa que a comunidade agora quer trabalhar para que o Rio Paraguai também seja detentor de direitos.

Mais proteção ambiental
Do ponto de vista jurídico, segundo a advogada Mariana Lacerda, do coletivo PesquisAção, a inclusão de direitos para a natureza na legislação local eleva o nível de proteção ambiental em Cáceres.

A iniciativa deve impedir que ações contrárias ao equilíbrio do Pantanal sejam permitidas no município. “Agora temos a incidência de um princípio chamado proibição do retrocesso em matéria ambiental, que diz que não podemos retroceder quando se trata de proteção ao meio ambiente. Atingir esse patamar significa alcançar um novo padrão de políticas públicas”, diz a advogada.

Na prática, acrescenta ela, a mudança implica não só na proteção de recursos naturais para uso do ser humano, mas em um cuidado que é independente dessa relação.

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Isso inclui respeitar processos ecológicos que envolvem toda uma bacia hidrográfica, por exemplo. Garantir que a natureza tenha seu curso normal.
Mariana Lacerda, advogada

Mariana ressalta que, considerando os licenciamentos recentes para transporte de nível industrial no Rio Paraguai, a iniciativa confere esperança à comunidade no sentido de barrar propostas prejudiciais ao bioma, ao menos em Cáceres.

Hidrovia pode prejudicar rios
Embora não exista um projeto oficial de hidrovia no estado, a aprovação de licenciamentos individuais para portos em diferentes localidades no Pantanal, segundo a advogada, tem colocado em curso a implantação de uma hidrovia na região. Além disso, os estudos dessas propostas também têm desconsiderado a extensão dos impactos no Rio Paraguai, entre Cáceres e Corumbá, em Mato Grosso do Sul.

“Verificamos que os estudos são em área mínima, de 1,5 km, e que inclusive um deles, no início do processo de licenciamento, era para a atividade de transbordo, de troca de modal de transporte. Mas, ao longo do processo de licenciamento, a atividade principal mudou para transporte dentro do rio e os estudos ficaram da mesma forma, mesmo o transporte sendo por mais de 700 quilômetros”, relata.

A advogada vê a iniciativa em Cáceres como uma tendência que pode ser seguida por outras organizações sociais Brasil afora. “Entendo que elas estão abertas a entender melhor e acompanhar os desdobramentos disso em Cáceres para, eventualmente, conseguir isso em outros municípios também.”

Como a inclusão dos direitos da natureza na Lei Orgânica de Cáceres foi uma emenda, não houve necessidade de a mudança ser sancionada pelo Executivo para entrar em vigor.

Fonte: UOL

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