Com um cenário global favorável para tornar a conservação da natureza um ativo econômico, ao mesmo tempo em que tais medidas possam garantir a manutenção de ecossistemas, Mato Grosso do Sul encaixa-se para ser beneficiado nessa realidade.
O Estado é detentor de 65% do Pantanal, bioma que é único no mundo, e os recursos globais estimados para serem convertidos para garantir a existência desse território podem alcançar US$ 60 bilhões.
O conceito envolvendo a utilização dessas cifras bilionárias faz parte de uma nova mentalidade em torno do uso da natureza.
Para conseguir materializar o quanto a conservação pode ser um negócio rentável para órgãos públicos, proprietários de terras e instituições que atuam no Pantanal e gerem riqueza a partir de geração de trabalho, foi realizado um estudo de pesquisadores apoiados pela Wetlands International Brasil, por meio do programa Corredor Azul.
Engenheiro florestal, mestre em Ecologia e Conservação e consultor da Wetlands, Fábio Padilha Bolzan participou do estudo para identificar como a natureza é uma fonte de recursos, mas é preciso recorrer aos mecanismos corretos para garantir que conservar torne-se rentável.
Essa proposta ainda é encampada pelo governo do Estado, que vem apoiando medidas ligadas à proteção e possui a proposta de se tornar uma unidade federativa de carbono neutro até 2030.
“Os valores encontrados foram estipulados usando o método de quanto as pessoas estão dispostas a pagar, resultando em valores potenciais que podem servir para análises comparativas”, explicou.
Para conseguir aliar conservação com obtenção de recursos financeiros e geração de renda, é necessário que o conceito de produção esteja muito interligado com a ciência, para que os critérios possam ser quantificados.
“Por exemplo, demonstrar que algumas áreas consideradas de baixo valor econômico em termos de oportunidade de produção, como áreas sujeitas à inundação ou com relevo muito acidentado, prestam serviços fundamentais, como regulação climática, produção de água em quantidade e qualidade, controle de processos erosivos, ciclagem de nutrientes, produção de alimentos, provisão de matérias-primas, polinização, recreação, expressões culturais e espirituais, entre outros”, explica Bolzan.
Os US$ 60 bilhões identificados no estudo foram detalhados no livro “Subsídios para Pagamento de Serviços Ambientais em Áreas Úmidas: Pantanal”, escrito por Fábio Bolzan, Fábio Roque e Rômullo Louzada. O lançamento ocorreu no auditório do Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul), neste mês.
O tema já vinha sendo abordado, e o que subsidiou essas novas tratativas foi uma publicação de 2021 intitulada “Valor monetário dos serviços ecossistêmicos do Pantanal e seu entorno: primeiras aproximações e perspectivas. Flora e Vegetação do Pantanal”, de Fábio Bolzan e colaboradores.
Mas como esses valores tão altos podem se tornar realidade? Basicamente, existe uma política chamada pagamento de serviços ambientais, ou PSA, a qual o pesquisador Bolzan explicou com mais detalhes.
“PSAs podem funcionar com financiamento de recursos públicos, privados ou mistos. Fundos de Meio Ambiente em âmbito estadual e municipal podem se configurar em fonte pública de recurso. Fundos internacionais, como os existentes em prol da conservação da Amazônia, também podem funcionar. Quanto aos recursos privados, organizações se beneficiam direta ou indiretamente dos serviços ambientais”, detalhou.
Já existem iniciativas em andamento para materializar o “dinheiro verde” no Pantanal. Iniciativas no Brasil estão muito ligadas ao contexto da água, como o PSA Manancial Vivo da Águas Guariroba e o PSA Rios Cênicos em Bonito. Há também o subprograma Carne Sustentável do Pantanal, que premia pecuaristas com até 67% de desconto do imposto devido para os produtores certificados na modalidade Pantanal Orgânico.
Modelos para se aplicar para obter crédito de carbono em áreas alagadas também são uma outra hipótese em questão, mas ainda não há regulamentação no Brasil.
Conforme informações do Senado, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) aprovou, em novembro de 2022, um projeto de lei que regulamenta o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE) de gases que provocam o efeito estufa. Mas o PL 412/2022 ainda precisa ser analisado na Comissão de Meio Ambiente (CMA).
PROJETOS EMPERRADOS
Apesar de o total previsto para a obtenção de recursos ser alto, projetos que envolvem mecanismos ecológico-econômicos dependem de diferentes atores e interesses para funcionar. Essa multilateralidade é o que deixa o acesso a recursos algo mais complexo.
“Ter à disposição recurso financeiro de forma contínua e no longo prazo é um desafio não só para o desenvolvimento e para a manutenção de PSA, mas para qualquer política dependente de recursos financeiros públicos”, ponderou Bolzan.
Em termos de legislações que possam incentivar esse novo conceito, há a Lei Federal nº 14.119, de 13 de janeiro de 2021. Ela instituiu a Política Nacional de Pagamentos por Serviços Ambientais, mas depende que estados e municípios criem suas leis para que o PSA seja regulado.
Em Mato Grosso do Sul, a Lei nº 5.235, de 16 de julho de 2018, criou o Programa Estadual de Pagamentos por Serviços Ambientais (Pesa) e estabeleceu o Sistema de Gestão do programa.
Porém, a fonte de financiamento ainda não é tão farta e com recursos como hoje tem no Fundersul, por exemplo.
Já em Mato Grosso, que tem 35% do território do Pantanal, não há iniciativas de pagamento para quem conserva cabeceiras dos rios.
Fonte:CE