Filhos de pequenos agricultores do Rio Grande do Sul, os irmãos Tatto ramificaram, ao longo de quatro décadas, a presença na política e acumularam um patrimônio imobiliário avaliado em pelo menos R$ 25 milhões. Com influência concentrada em um cinturão de bairros pobres na região sul da capital paulista, apelidado de “Tattolândia”, o clã petista terá papel importante nas candidaturas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Planalto e, especialmente, do ex-prefeito Fernando Haddad, que tenta se firmar como nome do partido na corrida estadual.
Os irmãos Tatto tratam o projeto político do clã como algo “coletivo”. O secretário nacional do PT, Jilmar Tatto, vai tentar uma vaga de deputado federal; outros dois irmãos, Enio e Nilto, buscam a reeleição, respectivamente, na Assembleia Legislativa de São Paulo e na Câmara dos Deputados. Se forem eleitos, a família terá cinco representantes em todas as esferas do Legislativo, já que Arselino e Jair cumprem mandato na Câmara Municipal paulistana. “Não é um projeto pessoal. É coletivo”, disse Jilmar ao Estadão. Hoje, esse projeto “coletivo” é impulsionado por aproximadamente R$ 30 milhões anuais em emendas e 85 nomeações nos gabinetes ocupados pelos irmãos.
O principal reduto do clã, a Capela do Socorro, com cerca de 130 quilômetros quadrados, tem mais de 600 mil habitantes. Lá, a família de dez irmãos construiu seu reinado político após um passado pobre em um distrito do norte gaúcho. Segundo apurou o Estadão, os Tattos se tornaram, nos últimos 40 anos, donos de 31 imóveis, avaliados em ao menos R$ 25 milhões. A reportagem chegou a esta soma com base em dados abertos do IPTU fornecidos pela Prefeitura de São Paulo, atualizados até o ano passado, e em certidões de cartórios de outras cidades paulistas. O cálculo é conservador, e baseado em valores venais – alguns deles há mais de duas décadas sem sofrer alterações. Muitos dos imóveis nunca foram registrados e constam apenas na base de dados do IPTU paulista.
Comunicação
Jilmar é a figura mais importante da família nestas eleições majoritárias. Secretário de Comunicação do PT, participa das pré-campanhas de Lula e Haddad e das discussões sobre um futuro plano de governo do ex-presidente. Com a responsabilidade de cuidar da comunicação nacional do partido, ele criou um núcleo dedicado a buscar manifestações de aliados do presidente Jair Bolsonaro que possam ser classificadas como “fake news” contra o PT e Lula. Nos canais petistas nas redes, tem tentado criar uma ponte com líderes evangélicos.
O último cargo público de Jilmar foi de secretário de Transportes na gestão Haddad. Ocupou a mesma pasta na administração de Marta Suplicy. Apresenta como marcas a criação do Bilhete Único e a expansão de ciclovias e faixas de ônibus.
Com Marta, a missão era tirar perueiros da clandestinidade. Por um deles, chegou a ser acusado de beneficiar o PCC. A polícia pediu a prisão e Jilmar, mas a Justiça rejeitou. “Essa testemunha, ele foi torturado”, afirmou ao Estadão. A testemunha era o perueiro Luiz Carlos Pacheco, o Pandora, que foi preso, mas acabou sendo absolvido. Hoje, ele é dono da Transwoff, que opera linhas de ônibus em São Paulo. Procurado, não quis falar.
Eleições
O poder dos Tattos se dá principalmente na ocupação de cadeiras legislativas. Deputado federal, Nilto quer a reeleição. Enio, deputado estadual, busca o sexto mandato. Foi três vezes primeiro-secretário da Assembleia Legislativa, e ainda mantém aliados na pasta, que tem 81 servidores. A Primeira-secretaria cuida de importantes contratos da Casa e é destinada ao PT em um acordo costurado há anos com o PSDB. Parte dos servidores são líderes de comunidades paulistanas e do interior de São Paulo, abrigados historicamente nos gabinetes do clã.
Enio é dono de um escritório de contabilidade que, segundo o deputado, faz “assessoria paralela na constituição e regularização de ONGs sociais”. O escritório é registrado na Receita como contato da Associação Marion, que atua no Jardim Maria Rita, na periferia da zona sul. A associação recebeu uma emenda de R$ 60 mil de Arselino, em 2020, para a reforma de sua sede. O parlamentar também pediu à Prefeitura a pavimentação da rua.
Ao todo, os Tattos fizeram indicações de R$ 30 milhões em emendas no último ano. Os vereadores Arselino e Jair indicaram R$ 6,1 milhões em emendas. Na Câmara Municipal, grande parte das emendas dos Tattos foi parar em quadras de futebol e eventos de lazer na periferia. No caso de Arselino, 100% de seus R$ 2,1 milhões em emendas foram destinados a Parelheiros e à Capela do Socorro. O vereador afirmou que, “sempre amparado na legislação”, busca destinar emendas “para bairros carentes que precisam de benfeitorias”.
Fonte: Estadão