Por mais de 30 anos, seu Hilton Ramos dos Santos trabalhou, como aeroviário, no Aeroporto Internacional de Campo Grande. Todos os dias, depois do trabalho, ocupava seu lugar em casa para contar as melhores histórias que envolviam aviões e aeroportos. O carinho com que falava da profissão rendeu no filho a paixão pelo céu.
Aeronauta, o filho Gabriel Peixoto dos Santos segue há quase 10 anos o sonho de pilotar aviões que, de tanto apoio do pai, marcou até sua morte, na última quarta-feira, 3 de fevereiro.
A esclerose lateral amiotrófica colocou um ponto final na vida de Hilton diagnosticado há três anos. E assim como no trabalho que ele se orgulhava, a despedida mais emocionante veio do céu.
Sem coragem de ver o pai no caixão e dar último adeus no chão, Gabriel decidiu sobrevoar o cemitério durante 40 minutos enquanto ocorria o sepultamento no Jardim das Palmeiras, no bairro Seminário.
A decisão foi tomada pelo piloto logo após a equipe da funerária chegar em casa e levar o pai que havia falecido. “Eu não queria me despedir daquela forma no cemitério, não era a imagem que eu desejava ter por último dele. E por sentir que ele está ao meu lado em todos os voos, optei por voar neste último momento”.
Gabriel e o pai no aeroporto, em 2015. (Foto: Arquivo Pessoal)
Gabriel decolou na tarde de quarta, vestido com o camisa do time dele e do pai, o Botafogo, e da torre de controle ouviu uma rápida homenagem dos controladores. “Eu precisava fazer algo que ficasse marcado tanto para mim quanto para ele. Queria fazer uma homenagem em que a gente pudesse estar perto como sempre estivemos. Então fiquei dando voltas, fazendo algumas passagens mais baixas e conversando com ele.”
Gabriel gargalhou e chorou na despedida. Lembrou de um pai que no dia a dia e no seio familiar utilizava sua paixão pelo aeroporto para desmitificar o medo de aviões, que aos fins de semana levava ele e sua irmã para ver os aviões pousarem e decolarem, que amava contar os bastidores da aviação que poucos imaginavam e que se emocionou quando voou pela primeira vez com o filho pilotando um avião particular.
“Eu chorei muito. A morte é um momento difícil, mas acho que eu precisava me despedir dessa forma. Foi o que veio no coração e tenho certeza que ele gostou”, diz o filho, que hoje trabalha como copiloto em uma grande companhia aérea.
Gabriel durante primeiro voo com o pai em Campo Grande
Natural do Rio de Janeiro (RJ), Hilton se mudou para Campo Grande há mais de 35 anos depois que conheceu a esposa e se casou. Foi aqui que se tornou aeroviário, deixou bons exemplos e espalhou seu amor pelo universo da aviação dentro de casa.
Era um homem, segundo o filho, que equilibrava a exigência com o bom humor. Sempre bom ouvinte, gostava de sentar para boas histórias, era parceiro dos filhos e da esposa.
Nos últimos anos, lutou para o retardo de uma doença que não tem cura. Mas os avanços tiraram-lhe a autonomia até se despedir da vida em casa.
Fonte: CGN LadoB