Desde criança, a curiosidade do artista têxtil Hígor Euzébio o levava a rodear as tias, seguindo horas de carreiras de fios entre pontos de crochê. Na pandemia, quando muitos se aventuraram em novos hobbies, o sul-mato-grossense começou a desenvolver peças entrelaçando fios – uma forma de manter o foco e atravessar um período difícil. O que nasceu como memória afetiva logo ganhou contornos de linguagem artística e, com o tempo, estrutura de negócio. Hoje, suas criações já vestem grandes estrelas da MPB.
“Nem passava pela minha mente fazer roupas para vender. Como eu trabalhava muito com desfiles e editoriais, por vir de um processo como cabeleireiro e maquiador, começaram a chegar pedidos. As peças saíram do meu uso pessoal para o comercial”, conta Hígor. Há pouco mais de um ano, ele lançou a marca que leva seu nome para atender demandas de amigos do setor de moda em Campo Grande. Esse movimento marcou o início de uma nova etapa, já acompanhada pelo Sebrae/MS, voltada à organização, posicionamento e profissionalização do empreendimento.
Selecionado para o Festival de Inverno de Bonito em 2024, Hígor viveu um processo de autodescoberta também como empreendedor. Biomédico de formação, precisou aprender a conciliar agenda, produção artesanal e estratégia de marca, alinhando criatividade e gestão. “Meu tempo de produção dura no mínimo três dias. A peça que demorei mais foi a arara [um vestido de crochê que retrata a ave], com três semanas. Exploro diversas técnicas no crochê, sempre com algo a mais: pérolas, pedrarias, metais, arames, sementes. Agora, uso até crochê resinado no próximo lançamento”, detalha.
Esse cuidado com o tempo e os processos dialoga diretamente com os princípios da sustentabilidade e do slow fashion. A marca de Hígor valoriza recursos locais e se contrapõe à lógica da produção globalizada em massa, conceitos que foram sendo aprofundados. “Enquanto o fast fashion descarta, o crochê reduz impactos. As peças duram mais que uma camiseta básica. Já realizo ações como o descarte correto de embalagens e a devolução dos cones de linha à fábrica, além de sempre levantar a bandeira da sustentabilidade”, afirma.
Conexões estratégicas
A consolidação da marca de Hígor Euzébio no mercado criativo conta com o apoio do Sebrae/MS, desde a orientação técnica, acesso a conhecimento, participação em eventos e geração de conexões estratégicas. Esse suporte é fundamental para transformar a produção artística em um negócio sustentável, capaz de dialogar com o mercado sem perder identidade.
Segundo a analista-técnica do Sebrae/MS, Penélope Haradon, profissionalizar artistas que estão na base da Economia Criativa exige um trabalho contínuo, que une teoria e prática. “Mentorias com especialistas, consultorias personalizadas e oportunidades de exposição estruturam jornadas criativas. Assim, o criador vira empreendedor, ganha autonomia e se insere no mercado com força e clareza”, explica. Ela destaca ainda que, ao aproximar estilistas, figurinistas, produtores e marcas em um mesmo ambiente, o Sebrae cria pontes que ampliam a visibilidade e aceleram trajetórias. “Esse tipo de conexão transforma carreiras, fortalece a moda local e mostra que o talento de Mato Grosso do Sul tem força para brilhar em qualquer lugar.”
Inserido nesse ecossistema, Hígor passou a compreender com mais clareza o posicionamento da própria marca e a força de sua identidade territorial. “Defino meu estilo como ousado porque minha marca tem muita essência, que vem do Pantanal. Entendi a importância do conceito Made in Pantanal e tomei isso como meta. O papel do Sebrae é fundamental, porque sentar para estudar o negócio é uma ferramenta que faz qualquer empresa prosperar”, reforça.
Foi nesse contexto que uma conexão decisiva aconteceu na última edição do EmpreendeFest 2025, maior festival de empreendedorismo de Mato Grosso do Sul, realizado pelo Sebrae em Campo Grande. Durante o desfile que integrou a programação, uma criação de Hígor chamou a atenção da figurinista Karen Bustolini, convidada pelo Sebrae/MS para ministrar uma palestra sobre mercado da moda e economia criativa no evento. “Ela desceu do palco, procurou a organização para saber de quem era a roupa e quis me conhecer. A partir dali, fizemos uma parceria muito bacana”, relata.
A partir dessa ponte construída dentro do ecossistema Sebrae, a carreira de Hígor ganhou novos contornos. Karen o conectou a artistas de grande visibilidade, ampliando o alcance de sua linguagem estética, musical e espiritual. No clipe “É Terreiro”, Daniela Mercury veste uma criação do artista com franjas que celebram ritmos afro-brasileiros. Inspirada na entidade Maria Padilha, a peça traz o vermelho como protagonista. “Era um vestido que criei para um desfile do Sebrae em 2024, quando o Pantanal estava pegando fogo. Chamei de ‘Pantanal em Chamas’, com degradê do vermelho ao laranja; quando a pessoa gira, parece uma chama”, relembra.
A trajetória internacional também começou a se desenhar. A cantora Juliane Gamboa, indicada ao Grammy Latino 2025 como Artista Revelação com o trabalho JAZZWOMAN, usou uma criação exclusiva de Hígor em Las Vegas. “Conseguimos sentar para conversar e alinhar ideias. Ela trouxe referências de cores e texturas e, a partir disso, criei o vestido ‘Seriema’, com base marrom e franjas douradas que remetem ao animal”, explica.
Brincando com movimento, texturas e comprimentos em vestidos longos, as criações de Hígor chamam a atenção, ao mesmo tempo que enaltecem uma produção manual e tradicional. “Ver meu trabalho ganhar o mundo dentro de uma técnica que estava quase esquecida é muito emocionante. O crochê está sendo resgatado, e tento transformá-lo para que nunca seja esquecido”, finaliza.
Atualmente, o artista vem projetando utensílios de trabalho no Living Lab, laboratório de inovação aberta e prototipagem do Sebrae/MS, desenvolvendo soluções que otimizam a produção artesanal e ampliam a eficiência do processo criativo. Para mais informações sobre as ações do Sebrae, a Central de Relacionamento atende pelo 0800 570 0800, e o portal é ms.sebrae.com.br.
Fonte:Asscon